Eu
sou S., tenho 26 anos, trabalho com mercado financeiro e perdi meu
namorado a 7 meses para uma leucemia. Perdi o homem da minha vida para
um câncer.
Em
2011 fui morar em BH a trabalho, e passava muito tempo em casa sozinha.
Um dia conversando com uma amiga, papo vai papo vem ela me contou sobre
um colega nosso de escola. Ele tinha descoberto que estava doente.
Estava com LMA ( Leucemia Mieloide Aguda).
Nunca
tivemos muito contato na escola. Eu sempre certinha, achava ele tonto
demais, bagunceiro demais, mulherengo demais. Nunca tivemos afinidade.
Pelo menos não até aquele telefonema. Ele me contou que estava bem,
estava super animado e confiante, que ia sair dessa e ia me convidar pra
tomar um chopp para comemorarmos. Trocamos e-mail e começamos a nós
falar diariamente, o dia todo. Ele reclamava do clima e da comida de
hospital e eu reclamava por estar longe da minha família e dos meus
amigos. Arrumamos algo em comum: A fome e a reclusão do mundo.
Como
vinha para SP semanalmente, comecei a visita-lo no hospital. Depois de
alguns meses não aguentando mais ficar longe de todo mundo voltei pra
casa. Fiz as malas e vim embora.
Felipe
estava ainda em tratamento e não podia sair pra muitos lugares. Então
passávamos a maior parte do tempo ou na minha casa ou na casa dele.
Passávamos horas batendo papo, dormindo, rindo, comendo. Não tinha nada
que eu fazia que não chamava a ele. Não tinha nada que ele fazia que não
me chamava. Todo mundo começou a comentar, brincar que estávamos
namorando específico. Acho que todo mundo percebeu antes mesmo de nós
dois.
Em
março de 2012 depois de sessões pesadas de químios o Fe se internou
para o transplante de medula. Foram longos dias sem visitas, sem
notícias. Dias cheios de angústia. Quase surtei. Chorava, chorava e
chorava. Até que um dia ele me mandou uma mensagem dizendo: Palhaça, a
medula pegou! To salvo! Ganhei a vida de novo.
Depois
de dias de angústia pude finalmente respirar de novo. Aos poucos fui
tendo meu amigo de volta. As conversas, os filmes no sofá da sala, os
restaurantes, as sessões de cinema, os bate papos. Éramos grudados,
amigos inseparáveis. Até que no dia da formatura da minha irmã as coisas
mudaram.
Naquele
baile, ele me tirou pra dançar. Aquelas luzes, os papéis caindo e ele
comigo. Não poderia ter sido mais perfeito. Seus braços na minha cintura
e os meus no pescoço dele, como num laço ou enforcamento desastrado, e
eu não conseguia pensar em nada. Nada mesmo. Eu tava ali vivendo,
dançando, olhando pra dentro dele e não pensava. Caiu a ficha! Não era
só amizade! Impossível ser apenas amizade.
Era
amor. O maior e mais bonito que já tive até hoje. Depois daquela noite
foi que a coisa desandou. Foi tudo muito rápido e intenso. Passava mais
tempo na casa dele do que na minha própria casa. Trocávamos centenas de
mensagem por dia. Eu que nunca gosto muito de ninguém gostei tanto dele.
Baixei a guarda, me entreguei de corpo e alma. Brigávamos muito muito
muito. Mas sempre fazíamos as pazes. Pela primeira vez na vida eu senti a
sensação de querer quem eu tinha. Eu o amava. Ele me amava. E apesar de
um odiar o outro as vezes, o amor sempre falava mais alto. Seria tudo
perfeito se a leucemia não tivesse voltado.
No
final de 2012 notei o Fe calado, distante, irritado. Estava sempre
cansado, irritado, nunca queria sair. Totalmente o oposto do cara que
convivi por tantos meses. Tentei fazer com que ele me dissesse o que
estava havendo mas foi inútil. Até que um dia ele me chamou pra
conversar e disse q já não nós entendíamos muito bem é que achava melhor
terminar nosso namoro para que não estragássemos a amizade. Fiquei
devastada. Sem entender. Nossa brigas eram brigas normais. Não tinha
motivos pra tudo aquilo. Pelo menos eu achava que não. Mas o Fe tinha.
Ele estava doente de novo. E sabendo tudo que teria que passar
novamente, terminou comigo pois não achava justo eu ter que sofrer com
ele tudo que ele tinha que sofrer.
Ele
era obrigado a passar por tudo aquilo, mas eu não. Um dia deixei meu
orgulho de lado e fui procurá-lo. Chegando na casa dele o encontrei aos
prantos no quarto. Foi aí que ele me contou. Acho que por alguns segundo
meu mundo saiu de órbita. Até digerir tudo aqui… Tive medo, pânico,
pavor… Não sei explicar o nome do que senti. Engoli todo o desespero, o
abracei e disse que ele não estava sozinho. Que ele querendo ou não, era
do lado dele que eu ia ficar. Enfrentaríamos tudo juntos e ele iria
ficar bom pra me levar pro altar. Porque era com ele que eu iria casar.
Hospital
Edmundo Vasconcelos. Ali virou nossa segunda casa. Quimioterapias,
vômitos, náuseas, efeitos colaterais, dor, angústia, medo… Muita coisa
ruim. Mas acho que nesse hospital foi onde aprendo o verdadeiro sentido
da palavra amor. Nos dias "bons" riamos, dormíamos de conchinha,
assistíamos filmes, batíamos papo. As vezes nem parecia um hospital. Nos
dias ruins Fe nem acordava pra dar bom dia. A essa altura já tinha
largado a faculdade e me dedicava apenas ao trabalho e ao Felipe. Era
uma corrida contra o tempo. Precisávamos de um doador. Sem irmãos de
mesmo pai e mãe, com a família pequena as chances eram mínimas. Não dava
pra saber até quando o corpo dele ia aguentar as pesadas sessões de
químios. Geralmente eram 30 dias internado e uma semana em casa pra
recarregar as energias. A cada dia nos tornávamos mais próximos. Acho
que depois do Felipe eu passei a acreditar em alma gêmea. Era incrível
como ele me conhecia só de olhar.
Em
um desses intervalos em casa, eu estava no trabalho quando a mãe dele
me ligou gritando: tínhamos achado um doador. O Felipe estava salvo. Ia
dar tudo certo. Estava acabando. Olha eu acho que nunca na minha vida me
senti tão feliz. Meu peito parecia que ia explodir de gratidão de
emoção de felicidade! Mas aí aparecem mil dúvidas: será que é mesmo
compatível? Será que a pessoa vai querer doar? Será que vai dar tudo
certo? Voltamos correndo pro hospital, dessa vez o São Camilo.
Começaram
novas sessões de químios. Uma mais agressiva que a outra. Mas dessa vez
tinha uma certeza: ia dar tudo certo. E deu. A medula era compatível, o
doador aceitou doar, o transplante foi um sucesso. Depois do
transplante é tudo muito sofrido e perigoso. A vulnerabilidade a
infecções e bactérias é enorme. A pessoa sente dores terríveis, perde
peso, sente náusea, tonturas, falta de apetite… O Fe superou tudo isso.
Ele tinha vencido.
Um
dias antes do meu aniversário (19/07) o Felipe teve alta. Ganhei um
bolo surpresa. Tinham meus avós, meus pais, meus irmãos, minha sobrinha,
meus grandes amigos e meu namorado BEM. Não tinha o que pedir na hora
de apagar as velas. Estava feliz! Plenamente e completamente feliz.
Acordei com café na cama e um beijo de bom dia. Infelizmente que
felicidade durou pouco. Poucos dias depois o Fe começou a se sentir mau e
teve que ser internado.
Não sei explicar, mas no dia que fomos para o hospital, mesmo ele estando clinicamente bem, eu sabia que ele não voltaria mais.
Foram
20 dias de internação! Os mais longos e mais sofridos. O Fe teve uma
piorada rápida. A cada dia quebrei chegava lá ele parecia pior e pior.
Ninguém sabia explicar como mas apesar do cuidado ele tinha contraído
uma bactéria. Teve uma infecção generalizada. Comecei a ver meu amor
indo embora. O desespero tomou conta de mim. É cortante não poder fazer
nada para aliviar a dor de quem a gente ama. Depois de 3 dias
aterrorizantes na UTI o Fe foi embora.
É
um momento que não separa ninguém por raça, sexo ou religião. Todo
mundo sente o mesmo, seja dor ou impacto. Todo mundo sente. Aquele
minúsculo milésimo de segundo que antecipa a pancada brusca que a gente
recebe no coração. Foi assim que eu senti quando me disseram que ele
tinha ido embora.
Daquela
noite de 20/08/2013 muito pouco me lembro. O que me lembro é que fiquei
ali, até o último suspiro. Apesar de todo o pavor. Enfrentamos juntos. E
eu morro de orgulho de ter sido a namorada do Felipe Ricardo Lopes. O
ogro mais fofo e romântico que eu vi na vida. O coração maior e mais
mole que eu pude conhecer. Eu cresci tanto com ele que não consigo mais
voltar ao tamanho que tinha antes, como se eu estivesse fora do lugar,
sabe? Sem ele eu sinto que não me encaixo mais na minha própria vida. Eu
sei que um dias as coisas vão voltar ao “normal”. É só que o mundo com
ele era mais seguro.
Não
sei se ele soube, mas as minhas melhores ações são sobre ele – e que as
minhas maiores confissões envolvem o que é nosso e o que ninguém mais
sabe. Ele nunca soube mas ele me salvou de mim mesma. Eu sei o cheiro
dele de cor e salteado. Eu sinto de vez em quando no meu quarto. Mesmo
que ele não esteja aqui.
Nos
falávamos do futuro como quem fala de um sonho bom. Juntei minhas
vontades com as dele, e as transformamos em momentos perfeitos. Vai
ficar guardado cada sorriso que trocamos. Vai ficar guardada cada
saudade que não matamos… E se o presente fugiu dos nossos planos, eu
pego o que passou e guardo num canto bonito do peito.
Ele é uma das histórias mais lindas que o meu coração tem pra contar…
***
Cuide bem do seu amor hoje. Porque o amanhã pode nunca chegar…
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Texto de uma leitora ao site Isabela Freitas.Gostou desta postagem? Então conheça também o Blog Reticências e leia mais..
Linda historia!!
ResponderExcluirSem palavras!!
Por isso eu sempre digo q o amor existe.
Bjsss