quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Um papo sobre sexo para quebrar paradigmas com o psiquiatra Flávio Gikovate

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É preciso se livrar de preconceitos e todo tipo de amarra para vivenciar o sexo verdadeiramente bom. A premissa pode parecer básica, mas, para a maioria de nós, ainda é uma utopia, já que nossa cabeça está contaminada de convenções e rótulos limitadores. É o que defende o psiquiatra Flávio Gikovate, 46 anos de experiência e 32 livros. Seus dois últimos são dedicados ao tema: Sexo, de 2010, e Sexualidade sem Fronteiras, lançado em março (ambos MG Editores). Gikovate, no entanto, é otimista e acredita que uma nova revolução sexual está em curso. Nesta conversa, ele esmiúça suas teorias, estimulando uma reflexão que pode ajudar a começar já a encarar de modo mais lúdico a cama - e, assim, aproveitar todas as suas possibilidades.
O futuro das relações
É bom que se diga logo que, apesar de ter um discurso mais libertário, o psiquiatra não acredita que nosso destino seja o poliamor, o polissexo e por aí vai. O conceito de sexualidade sem fronteiras, que dá título ao livro, nada tem a ver com todo mundo sair transando com todo mundo. Sua crença é outra: caminhamos em uma direção mais romântica, de uma busca cada vez maior por vínculos afetivos, não meras transas. "A própria luta dos homossexuais pelo casamento gay talvez seja um sinal dessa tendência." Essa nova visão da atração sexual pode não resultar em relações mais duradouras no futuro, mas Gikovate tem certeza de que os encontros serão de melhor qualidade. "Um irá achar graça no outro para ir além do sexo."
A Nova Orientação
Embora ressalte que ninguém sabe explicar ao certo como se dá a orientação sexual ou ocorre uma eventual mudança, o médico afirma que há uma relação direta entre o desejo e a agressividade. Se ela está voltada para a figura masculina, possivelmente é para esse alvo que o desejo sexual será direcionado. Desde a infância, os homens são estimulados, até nas brincadeiras (futebol, outros esportes de contato, lutas), a ter um comportamento mais agressivo. Tornam-se heterossexuais, segundo Gikovate, quando direcionam para as mulheres a raiva acumulada, na forma de cobiça. E isso é frequente. "Até pouco tempo atrás, afinal, eles tiveram de lidar com a frustração de não ser desejados pelas meninas da sua idade, que estavam sempre atrás dos rapazes mais velhos", diz. Mas a criação está em processo de transformação e os comportamentos também: "O `ficar¿ eu já considero que foi uma grande e positiva mudança nesse aspecto". A onda abriu a possibilidade de experimentar sensações com vários parceiros desde cedo. Por essas e outras, ele acredita que rumamos para uma realidade diferente: "No futuro, o que irá determinar a orientação sexual não será esse desejo agressivo, mas o encantamento e o envolvimento sentimental". Aí o destinatário pode ser do sexo oposto ou do mesmo sexo.
Ranço machista
Em todas as pesquisas sobre sexualidade humana conduzidas por homens - e foram várias! -, reina uma lógica machista. "A mulher sempre aparece tendo de acompanhar os passos do homem, como acontece na dança, e o prazer feminino nem sequer é considerado", afirma o psiquiatra. "Freud dizia que a maturidade sexual de uma mulher era a capacidade de desenvolver um orgasmo interno ao mesmo tempo que seu parceiro." Assim, se formaram generalizações e rótulos nocivos. "Fica estabelecido que quem tem a orientação voltada para o mesmo sexo é homossexual; e para o oposto, heterossexual. E as pessoas sensíveis aos dois corpos são chamadas de bi", exemplifica o expert. No entanto, não existe uma única forma de se relacionar. Para começar, há diferenças de gênero: "As mulheres não têm desejo, e sim excitação".

Desejo X Excitação
O primeiro, diz o médico, é ativo, um impulso quase primitivo de tentar agarrar o objeto - algo identificado como masculino. "No mundo animal, é o cão que corre atrás da cadela", ilustra Gikovate. Já a excitação é um estado de inquietação agradável e interno - e a masturbação é um gatilho para atingi-lo. O desejo, por sua vez, pede estímulos externos, essencialmente visuais. O psiquiatra conta que Freud, em uma nota de rodapé, escreveu que durante a evolução, na passagem do quadrúpede para o bípede, o que era olfativo em outras espécies virou visual na nossa. "Esse talvez seja um daqueles chutes brilhantes de Freud. Não sei se a mudança aconteceu exatamente aí, mas o pensamento serve como uma bela metáfora para ilustrar como é o macho humano", diz. Para Gikovate, as mulheres, em geral, não são sensíveis a estímulos visuais e, assim, não têm desejo. "Elas se excitam mais ao se perceberem desejadas", afirma. "Muitas ficam bravas comigo quando falo isso, como se ter desejo fosse uma qualidade." Talvez porque se sintam discriminadas. Mas o médico não está dizendo que as mulheres não sentem entusiasmo erótico e vontade de transar. Elas apenas funcionam de forma diferente - o que pode ser até uma vantagem.
Sexualidade sem preconceito
"Eu costumo dizer que, se você estiver de olhos fechados e alguém lhe fizer sexo oral, não existe a menor possibilidade de saber se ali está um homem ou uma mulher, porque a sensação é exatamente a mesma", conta Gikovate. Só que, se ao abrir os olhos, você se defrontar com uma pessoa que não corresponde às convicções estabelecidas, sentirá incômodo. "Isso é preconceito", ressalta, comparando qualquer ideia preconcebida ao muro de Berlim, que separou duas Alemanhas iguais. É preciso abrir túneis para romper essas barreiras. Para ele, o mundo feminino é menos preconceituoso - e o aumento que ele observa no número de mulheres de diferentes idades vivendo relações com o mesmo sexo seria uma prova disso. "A ruptura pode ocorrer por causa de uma decepção com um parceiro masculino ou por outros motivos, inclusive circunstanciais, como tomar um drinque a mais, brincar com uma amiga e aí descobrir que aquilo também é bom." A internet seria outra contribuição para derrubar preconceitos, pois o anonimato é incentivo para exercer a curiosidade e, por exemplo, olhar um site homossexual e acabar se excitando. Gikovate diz que é mais fácil para uma mulher encarar com naturalidade essa situação. "O homem provavelmente colocará em dúvida a sua virilidade", prevê. "Na realidade, todo clima erótico pode excitar."
Fim Do Sexo Casual
Um fato observado pelo psiquiatra: homens e mulheres têm se divertido mais com a masturbação do que com transas eventuais. Para Gikovate, é um indício de que o sexo casual ruma para a extinção. "As mulheres até tentaram se divertir com isso também, mas não acharam graça", afirma. Com qualquer coisa na vida, é natural que, depois de um período de deslumbramento e abuso, as pessoas mudem o foco. "Aquilo acaba ficando enjoativo", enfatiza. "Além disso, fora do clima romântico, a masturbação é a melhor coisa que existe. Você atiça a fantasia e não tem depois. O problema do sexo casual é o depois."
Na cama com um amigo?
Sim, por que não? "Simpatia, amizade e todos os sentimentos positivos genericamente chamados de amor agregam valor", ressalta o psiquiatra. Mas a ideia de ir para a cama com um amigo ainda soa inadequada. Para a maioria, atração, desejo e excitação não combinam com amizade. Prova 1: homens heterossexuais são mais amigos de outros homens do que das mulheres. Entre eles, ficam à vontade para jogar bola ou ir a bares, beber, conversar e falar mal do sexo oposto. Prova 2: os homossexuais são muito mais amigos de mulheres do que de outros homens. "Meu sonho é um mundo em que os indivíduos possam ter erotismo ligado à amizade, que é uma versão ainda mais sofisticada do amor", diz. "Essa é a grande revolução que, aos pouquinhos, já está em curso."
Educação pró-prazer
Para chegar ao ideal do sexo livre e prazeroso, outras mudanças precisam ocorrer na sociedade - e a forma de educar é uma delas. É necessário, afirma Gikovate, acabar com o enfoque machista adotado na criação dos meninos. Segundo ele, a ideia de um mundo unissex pegou mais entre as meninas, às quais foi permitido se apropriar de vários elementos do universo masculino. Hoje, elas podem jogar futebol e videogame, praticar luta, andar de skate... Mas os meninos continuam sendo malvistos se gostarem de brincar de boneca ou quiserem fazer balé. "Isso é cultural, pois, na Rússia, a noção é de que bailarinos podem ser homo ou heterossexuais e todos são respeitados. Aqui parece que o balé já define a orientação do desejo e estigmatiza", observa. "Esse crime contra garotos mais delicados deve desaparecer." Se isso vai aumentar ou reduzir o número de pessoas se relacionando com o mesmo sexo, não importa. "É mais bacana pensar que diminuirá a conexão entre desejo e agressividade, e os homens vão poder estabelecer vínculos afetivos e eróticos de maior qualidade."
Só o amor salva
No fim dos anos 1960, os teóricos acreditavam que a revolução sexual faria com que o amor prevalecesse. Não foi o que aconteceu. "Na verdade, tudo acabou piorando", afirma Gikovate. Resultado: as relações foram se tornando cada vez mais frágeis, fugazes e sem significado. "Acredito que foi preciso passar por esse processo todo para entendermos que houve excessos e, agora, é fundamental ampliar o impacto do amor sobre as relações."

DA REVISTA CLÁUDIA



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