terça-feira, 17 de junho de 2014

Acabamos de separar, mas vivo com vontade de dizer algo a mais, algo que ele precisa ouvir. Devo ceder ao impulso ou me distanciar de vez?

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O QUE FAZER?
Meninas, o fim do amor é um negócio infinito. É luto. Leva tempo, consome uma enormidade de energia e sono e humor. Quando os dois se distanciam, a cada vez é uma história particular nos detalhes mas universal na essência: a gente se sente sem pé, sem braço, sem passado e sem futuro. Tudo é presente. E o presente é uma titica.
Ah, moças, eu quero explicar tudo e não vou conseguir sujar nem as canelas.
Mas antes de prosseguir, quero ser direto na resposta: não, não fale mais com ele. Vocês já disseram o que tinham de dizer. Já teve papo e já teve e-mail. Chega. Sempre haverá algo a mais pra rebater. É infinito, posto que é a gente em chamas. E só acaba quando você disser que acabou. Você precisa dizer que acabou!
Se um casal termina com respeito, abertura, dor mas educação, sim, vale uma conversinha pra botar ponto final, desde que a conversinha não seja apenas uma chance de tacar no outro todo o peso de um fracasso. Desde que não seja um sadismo, uma vontade de machucar.
Quando o amor acaba porque esvaziou, a culpa é sempre um milhão de culpas. Uma soma de coisas que ele fez e não fez, com coisas que você fez e não fez, mais o mundo todo agindo sobre os dois. Nunca é simples. Só o resultado é: acabou, acabou.
Portanto, uma última conversa, sim. Depois, distância, silêncio, paciência, choro e tempo.


QUANDO O AMOR ACABA
Quando o amor acaba, a gente amaldiçoa aquilo que viveu. Como se todos aqueles planos, o bebê que não nasceu, a casa maior que vocês não compraram, a velhice companheira, as viagens não feitas e as viagens feitas, os bons dias de sexo e o péssimo sexo medonho da rotina; a falta de sexo; as boas piadas e as DRs colossais; tudo se torna um tempo perdido, uma certa humilhação, a vergonha daquele que descobre no passado e no futuro uma picaretagem.
Meninas, quando era menino, fui a uma festa. Era uma lanchonete o cenário. E na lanchonete, havia um bolo e havia um mágico. Do bolo, não lembro a cara. Mas o mágico, em certo momento de seu número, me convocou a assumir a dianteira das crianças. Eu levantei e fui. Eu tinha uns 8 anos.
O mágico fez lá uns movimentos e, num puxão, arrancou uma cuequinha. Meus amigos riram. Minha mãe riu. Alguém fotografou. Eu não ri. Lembro de pensar em dizer ao mágico: “eita, que isso! Ô, mágico, essa aí não é a minha cueca, não! A minha cueca é maior [era uma cuequinha realmente mínima a que o mágico balançava], é branca [era uma cueca creme, a na não do mágico] e nela não tem nenhum cachorro desenhado, tem é um Batman voando!”
Mas não disse.
E o mágico não ouviu, apenas riu de novo, e repetiu a graça diante de todos os meninos e todas as meninas: aquela cuequinha mínima, aquele cachorro desgraçado, aquilo não era meu, mas virou. Eu estava com a minha cueca do Batman, mas estava nu. Olha que coisa.
E aquela foto – o mágico exibindo a cueca que não era a minha cueca, as crianças rindo, eu com o olhar do espanto contido, dizendo milhões de desgraças por dentro, mas mudo por fora –, aquela foto, eu não sei bem o motivo, ainda me causa qualquer coisa estranha.
(Vocês não perguntaram, mas abro o parênteses porque quero responder: convivo com a foto até hoje porque, acreditem, a foto dorme num lugar de altíssima exposição na casa da minha mãe… Quando a visito, visito o mágico. E como o sentimento é besta – tanto tempo depois –, nada digo. Mas o sentimento é aquela fotografia na parede. E como dói.)
Enfim, digo isso porque é isso o que acontece com a gente, com as memórias da gente, quando um amor acaba: sobretudo quando o amor que acaba é uma decisão tomada pelo outro.
Dá uma vergonha dos outros. Dá uma vergonha do espelho.
Quero dizer que a gente pensa assim: se aquilo lá – que fazia tanto sentido –, ao deixar de fazer sentido assim, com um simples aviso… A gente pensa, então, no seguinte: o que mais faz sentido? Haverá algum sentido a dois? Vale a pena encontrar alguém novo? Passar por tudo aquilo de novo? Confiar? E fora a busca na multidão de gente sozinha… Ser solteiro de novo é tão difícil. E tem aquele constrangimento dos primeiros encontros, o sexo que começa atrapalhado, descobrir como é a família do outro, descobrir como é o outro, ficar doente na frente do outro… Dá uma preguiça, dá um medo…
Haveria, enfim, motivo de tentar tudo de novo? O que deu errado? Por que dá sempre errado?

FALO COM ELE?
Nasce aí, nessa tentativa de entender uma montanha de coisas altíssimas, tudo ao mesmo tempo, tudo mudando a cada momento, tudo afetado pelo jeito em que estamos no momento; nasce aí a vontade infinita de não deixar ir o antigo amor. De ver no antigo amor um acerto de contas com o cosmo. De sempre querer dizer algo a mais. De se submeter agora àquilo que daqui a meses será uma espécie de vergonha. De implorar por uma chance, quando a gente sabe que aquilo lá que existiu já evaporou. De não topar de frente com essa morte.
(Uma regra: toda pessoa que insistiu atrás de um amor que foi embora, um dia se arrepende, com certa vermelhidão na cara, de não ter resistido ao impulso.)
Ah, meninas: o fim de um amor é um ensaio de morte. De certa forma, quando aquele passado que era uma promessa alegre de futuro a dois, quando ele acaba, o que nos resta é um futuro todo novo, vazio, solitário, todo escombros. É mesmo nascer de novo. Mas nascer sem aquela vantagem linda dos nenês, a de curtir uns primeiros anos de pura bebezice, sem falar, sem se preocupar, recebendo o mamar e o único amor incondicional e eterno que a gente conhece.
Ah, mas que inveja dos bebês. Bebês, meninas, são escravos do prazer. São a sabedoria humana em seu máximo. A gente cresce pra evoluir em passos de moonwalk. Viver é estranho.
Não, não. A vida depois da morte do amor é uma nova vida em que a gente nasce sabendo de tudo. Sim, sabendo que as coisas, em geral, dão errado. Há toda uma existência anterior aí, na cuca, nas mais acessível das memórias, comprovando…
Portanto, respondo de novo: não, não fale com ele.
Não adianta.
IGNORAR?
Meninas, já molhei as canelas no assunto, a esta altura. Vamos ao joelho:
Quando um casal se separa, eu acho aceitável uma última conversa franca.Aquela conversa que pode acontecer um dia, uma semana, um mês depois do anúncio final. Uma conversa com educação. Uma única conversa.
Sei que um encerramento de amor em que um dos lados engole sapos, cobras, lagartos é como aquela cuequinha eterna, com o cachorro pintado, e aquele mágico infernal, ainda hoje segurando diante de mim uma vergonha pregada em minha mente, e que topei calado.
Ah, mas como me arrependo de não ter dito naquela lanchonete: “Ô, diabo, essa diacha dessa cueca não é minha, você é um picareta e eu quero um pirulito!”.
Mas não disse.
Portanto, sim, uma última conversa a dois, se for realmente necessária. O outro precisa escutar o seu lado, e não apenas dizer o dele; eis o último ato a dois quando o dois não mais existe. Sim, acho que essa última conversa é aceitável.
Mas entendam: uma última conversa. E uma última conversa que nasce da segurança de que algo muito essencial deve ser dito uma última vez. Porque, no fim, quando dizemos ao outro, dizemos a nós. E tudo bem expiar.
Depois, nada mais. Silêncio, distância.
Eis a verdade de hoje, meninas: não existe, não existe mesmo, uma conversa final. A gente precisa dizer que ela é a última. Que acabou. A cada dia, a cada memória, a cada remoída daquilo que que foi falado, não falado, vivido e não vivido, haverá sempre algo que faltou cuspir no outro.
E aí é infernal.
Meninas, é preciso saber morrer.
E renascer.
Longe daquilo tudo.
Tenham uma última conversa a dois. Dolorida mas educada.
E depois, nada mais.



J. Antônio

Meu nome é J. Antônio e sou um amador. Jogador de futebol amador, jornalista amador e poeta amador. Frequento duas academias: a de Letras e a do bairro. Na última, convivo e suo ao lado de halteres e halterofilistas amadores. E ao lado de meninas, que brincam de fuzilar gordurinhas, todas lindinhas, molhadas e com calça fusô (minha leitora: é 'fusô' ou 'fuseau' o nome da calça? Eu tenho essa dúvida). Mas dizia que sou poeta e malhador. Aos fins de semana, gosto de correr e comer. Sou bruto e macho, mas sensível. Choro escondido – e ó, se um amigo me perguntar, eu nego. Eu nego! Mas sim. Quando a coisa aperta, quando a vergonha afrouxa, ou quando uma de vocês, mulheres, me machuca, eu choro. É assim desde que nasci. Há 30 anos.

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